Diretriz Brasileira Sobre o uso de Imunobiológicos para Rinossinusite Crônica com Pólipos Nasais - Atualização de 2024
- Pâmella Marletti
- 5 de mai.
- 9 min de leitura

Apresentamos aqui a diretriz atualizada de 2024 que orienta o uso de Imunobiológicos para Rinossinusite Crônica com Pólipos Nasais (RSCcPN), visando melhorar a seleção de pacientes.
Impacto da Inflamação do Tipo 2
Os medicamentos biológicos têm revolucionado o tratamento da RSCcPN, especialmente em casos graves. A inflamação do tipo 2 é mediada por citocinas e células específicas, como eosinófilos.
A inflamação do tipo 2 é orquestrada por mediadores como IL-4, IL-5, IL-9 e IL-13.
Eosinófilos são o principal marcador celular dessa inflamação.
A resposta do tipo 2 é desencadeada por alérgenos, infecções e outros estímulos.
Critérios de Elegibilidade para Biológicos
A diretriz propõe um novo critério de elegibilidade para o uso de biológicos em pacientes com RSCcPN, baseado em quatro pilares principais. Esses critérios visam garantir que os pacientes mais necessitados recebam o tratamento.
Os quatro pilares incluem: impacto da doença na qualidade de vida, extensão da doença nasossinusal, presença de comorbidades do tipo 2 e biomarcadores de inflamação do tipo 2.
A avaliação é flexível e pode ser ajustada conforme novos conhecimentos e mudanças na custo-efetividade.
Fenótipos Associados à Inflamação do Tipo 2
Nas RSC, alguns fenótipos são caracterizados por reação tipo 2, como:
Rinossinusite crônica com pólipo nasal eosinofílica
- Faixa etária mais tardia, entre 30 a 50 anos,
- Pode-se apresentar exacerbações agudas, perda do olfato, asma de início tardio e boa resposta ao corticosteroide oral e tópico.
- Um subtipo importante, que apresenta prognóstico mais reservado, é a DREA (Doença Respiratória Exacerbada por Aspirina): presença de pólipos nasais, asma e intolerância à aspirina ou anti-inflamatórios não hormonais.
Rinossinusite fúngica alérgica (RSFA)
- Acomete em geral pacientes adolescentes ou adultos jovens, imunocompetentes, e que apresentam forte componente atópico.
- Critérios diagnósticos: (1) Presença de RSCcPN, (2) hipersensibilidade mediada por IgE para fungos, (3) mucina eosinofílica (comumente há intensa degranulação eosinofílica com formação de cristais de Charcot-Leyden), (4) presença de estruturas fúngicas não invasivas e (5) alterações radiológicas características da presença de fungos, como hiperdensidades compactas nos seios paranasais (combinação de vários metais concentrados pelos fungos).
- Pode ser tratada com múltiplos cursos de corticosteroide oral e tópico, antibióticos e cirurgia.
Doença Atópica do Compartimento Central (DACC)
- RSC se apresenta, habitualmente, a partir dos 18 anos, com outras manifestações alérgicas, como rinite alérgica, dermatite e asma, geralmente presentes desde a infância.
- Normalmente não demonstram alterações do olfato.
- Ao exame endoscópico, chamam a atenção as alterações polipoides nas conchas médias e superiores e no septo posterosuperior, enquanto a mucosa dos seios paranasais se apresenta normal ou com poucas alterações à tomografia
- Boa resposta a tratamentos com corticosteroide tópico e oral.
Granulomatose Eosinofílica com Poliangeíte (GEPA)
- Também chamada de síndrome de Churg-Strauss: é uma vasculite de pequenos vasos, que apresenta asma grave e eosinófilia adultos.
- A manifestação nasossinusal normalmente ocorre nas primeiras fases da doença, diagnosticada clinicamente como rinite alérgica, rinossinusites de repetição ou RSCcPN.
- Laboratorialmente, as alterações encontradas são inespecíficas: eosinofilia maior que 10% ou mais de 1.000 células/µL, elevação velocidade de hemossedimentação e proteína C reativa, aumento sérico de IgE, de fator reumatoide, e fator antinuclear.
- Associa-se com alterações renais e neuropatia, em que a biopsia revela a vasculite.
- Embora seja uma doença de natureza autoimune, apenas 30 a 40% dos pacientes apresentam p-ANCA positivo.
Granulomatose com Poliangeíte (GPA)
-Anteriormente denominada de Granulomatose de Wegener
-É uma doença inflamatória crônica autoimune, de etiologia desconhecida, com lesões granulomatosas necrosantes e vasculite sistêmica de pequenos e médios vasos, fortemente associada a anticorpos anticitoplasma de neutrófilos (ANCA).
-O gatilho inicial pode ser uma infecção ou outros fatores ambientais possivelmente combinados com suscetibilidade genética.
Efeitos das Interleucinas nas RSC
As interleucinas do tipo 2 desempenham um papel crucial na patogênese da RSC, influenciando a inflamação e a resposta imunológica. A IL-5, IL-4 e IL-13 são as principais citocinas envolvidas.
A IL-5 controla a diferenciação e ativação dos eosinófilos.
A IL-4 induz a produção de IgE e ativa mastócitos.
A IL-13 está associada à secreção de muco e hiperplasia de células caliciformes.
Omalizumabe: Indicações e Mecanismo de Ação
O Omalizumabe é um anticorpo monoclonal anti-IgE aprovado para o tratamento de asma alérgica moderada a grave e rinossinusite crônica com pólipos nasais (RSCcPN). Ele atua bloqueando a IgE, reduzindo a inflamação e melhorando os sintomas alérgicos.
Aprovado pela FDA em 2003 para asma alérgica moderada-persistente refratária ao tratamento com corticóide inalatório (em maiores de 6 anos)
Tem aplicação na urticária crônica espontânea refratária ao tratamento com anti-histamínicos H1 (em maiores de 12 anos)
A Anvisa aprovou o uso em RSCcPN em 2021, para maiores de 18 anos, que não apresentam controle com corticóide intranasal.
Reduz concentrações séricas de IgE livre e a ativação de mastócitos.
Melhora o controle da asma e a qualidade de vida dos pacientes.
Omalizumabe: Posologia
A administração é subcutânea, com meia-vida de 26 dias e efeitos clínicos visíveis após 4 semanas.
Eficácia do Omalizumabe em Doenças Respiratórias
O Omalizumabe demonstrou eficácia em reduzir exacerbações da asma e melhorar sintomas em pacientes com RSCcPN. Estudos mostraram resultados positivos em diferentes parâmetros de inflamação e qualidade de vida.
Estudos mostraram redução significativa nas exacerbações da asma e uso de medicações de resgate.
Em RSCcPN, houve melhora nos escores de pólipos nasais e sintomas das vias aéreas superiores.
Resultados de ensaios clínicos indicaram melhora na qualidade de vida em pacientes tratados.
Revisão do Uso em RSCcPN
A terapia com Omalizumabe mostrou-se benéfica em pacientes com RSCcPN, especialmente aqueles com asma grave associada. A redução dos escores de pólipos nasais e a melhora nos sintomas foram observadas em vários estudos.
Estudo de Gevaert et al. mostrou redução significativa no escore de pólipo nasal em pacientes tratados.
O tratamento foi associado a melhores escores de qualidade de vida e redução de sintomas nasais.
A análise post hoc indicou eficácia em pacientes com asma grave.
Comparação com Outros Tratamentos Biológicos
O Omalizumabe é comparado a outros anticorpos monoclonais, como Mepolizumabe e Benralizumabe, que também visam a inflamação eosinofílica. Cada um tem seu mecanismo de ação e eficácia em diferentes condições respiratórias.
Mepolizumabe e Reslizumabe são antagonistas da IL-5, reduzindo eosinófilos.
Benralizumabe se liga ao receptor de IL-5, promovendo a apoptose de eosinófilos.
O Mepolizumabe é o único aprovado para RSCcPN no Brasil.
Segurança e Efeitos Colaterais do Omalizumabe
O Omalizumabe é geralmente bem tolerado, mas pode causar reações adversas, como anafilaxia e reações no local da injeção. A segurança foi confirmada em ensaios clínicos, com eventos adversos semelhantes ao placebo.
Risco de anafilaxia em 0,2% dos casos.
Efeitos colaterais comuns incluem infecções do trato respiratório superior e dor de cabeça.
Não foi associada a um aumento significativo de malignidade.
Indicações e Posologia do Omalizumabe
O Omalizumabe é indicado para asma alérgica moderada a grave e RSCcPN em adultos. A dosagem é baseada no nível sérico de IgE e peso corporal, com administração subcutânea a cada duas a quatro semanas.
Indicado para pacientes com asma inadequadamente controlada por corticosteroides.
A posologia varia de acordo com o nível de IgE e peso corporal.
A meia-vida do Omalizumabe é de 26 dias, permitindo administração infrequente.
Aprovação e Indicações do Dupilumabe
O Dupilumabe é um anticorpo monoclonal aprovado para o tratamento de várias condições inflamatórias, incluindo dermatite atópica e rinossinusite crônica com pólipos nasais (RSCcPN). Desde sua primeira aprovação em 2017, ele se tornou uma opção importante para pacientes que não respondem a tratamentos convencionais.
Aprovado pela FDA em março de 2017 para dermatite atópica moderada a grave.
Aprovado pela EMA em outubro de 2017 e pela ANVISA no Brasil em 2017.
Indicado para RSCcPN desde julho de 2020, especialmente em pacientes intolerantes a corticosteroides ou com contraindicações cirúrgicas.
Mecanismo de Ação do Dupilumabe
O Dupilumabe atua bloqueando as citocinas IL-4 e IL-13, que são mediadores da inflamação do tipo 2. Isso resulta em uma redução significativa de biomarcadores inflamatórios associados a condições alérgicas.
Bloqueia a subunidade alfa do receptor IL-4, inibindo a ação da IL-4 e IL-13.
Reduz biomarcadores como eotaxina-3, TARC, periostina e IgE total sérica.
Eficaz na modulação da resposta inflamatória em doenças respiratórias como asma e RSCcPN.
Eficácia do Dupilumabe na Asma Grave
O Dupilumabe demonstrou eficácia em ensaios clínicos para pacientes com asma grave, resultando em melhorias significativas na função pulmonar e na qualidade de vida. Os estudos mostraram uma redução nas exacerbações e na necessidade de corticosteroides orais.
Estudos mostraram redução de exacerbações em até 50% em pacientes tratados.
Melhora na função pulmonar e qualidade de vida relatada pelos pacientes.
Eficácia observada em ensaios como QUEST, VENTURE e TRAVERSE.
Resultados em RSCcPN
O Dupilumabe é o primeiro biológico aprovado para RSCcPN, mostrando resultados positivos em qualidade de vida e redução de sintomas. Ensaios clínicos demonstraram melhorias significativas em obstrução nasal e tamanho dos pólipos.
Estudos SINUS-24 e SINUS-52 mostraram melhora significativa em escores de qualidade de vida e obstrução nasal.
Redução do tamanho dos pólipos e melhora na função pulmonar em pacientes tratados.
Eficácia observada independentemente de cirurgias nasais prévias.
Eficácia em Pacientes com DREA
Pacientes com Doença Respiratória Exacerbada por AINE (DREA) mostraram respostas mais significativas ao tratamento com Dupilumabe. O medicamento não apenas melhorou os sintomas da RSCcPN, mas também a função pulmonar.
Melhora significativa em escores clínicos e controle da asma em pacientes com DREA.
Redução nos níveis urinários de LTE4, indicando diminuição da inflamação.
Dupilumabe demonstrou induzir tolerância a AINE em alguns pacientes.
Posologia e Administração do Dupilumabe
A administração do Dupilumabe é feita por via subcutânea, com uma dose inicial de 300 mg a cada duas semanas. A possibilidade de aumentar o intervalo entre as doses após 12 meses foi observada em estudos.
Dose inicial de 300 mg, seguida de 300 mg a cada duas semanas.
Estudo mostrou que aumentar o intervalo para 24 semanas manteve a eficácia.
Treinamento para autoadministração é recomendado para pacientes.
Segurança e Efeitos Colaterais do Dupilumabe
Embora o Dupilumabe tenha um perfil de segurança favorável, alguns efeitos colaterais, como conjuntivite e reações no local da injeção, foram observados. A segurança em populações pediátricas e grávidas ainda não está bem estabelecida.
Eventos adversos mais comuns incluem nasofaringite e cefaleia.
Conjuntivite foi mais associada a estudos em dermatite atópica do que em RSCcPN.
Categoria de uso na gravidez: B, não recomendado sem orientação médica.
Comparação com Outros Biológicos
O Dupilumabe se destaca em comparação com outros biológicos, como Omalizumabe e Mepolizumabe, especialmente em relação à eficácia na função olfatória. Estudos sugerem que o Dupilumabe é mais eficaz na melhora da olfação em pacientes com RSCcPN.
Melhora na função olfatória de 14 pontos no UPSIT após 16 semanas de tratamento.
Omalizumabe mostrou melhora menor, com diferença de 3,8 pontos.
Mepolizumabe não demonstrou melhora significativa na função olfatória em testes psicofísicos.
Novos Imunobiológicos em Desenvolvimento
Novos imunobiológicos, como anti-IL-33 e anti-TSLP, estão sendo desenvolvidos para tratar RSCcPN e outras condições respiratórias. Esses agentes visam a resposta imune inata e podem oferecer novas opções de tratamento.
Estudos em fase 2 e 3 estão avaliando a eficácia de anti-IL-33 e anti-TSLP.
Tezepelumabe mostrou resultados promissores em asma, com potencial para RSCcPN.
A pesquisa continua para entender melhor a eficácia desses novos agentes em diferentes fenótipos de RSC.
Testes de Identificação do Olfato
Os testes de identificação do olfato, como o UPSIT, CCCRC e Multiscent-20, são utilizados para avaliar a função olfatória dos pacientes, permitindo a classificação de sua capacidade olfativa.
O UPSIT consiste em 40 odores em quatro bloquetos, onde o paciente identifica odores raspando uma faixa marrom.
O CCCRC avalia tanto o limiar olfativo quanto a identificação de odores, utilizando Butanol e outras substâncias, com escore de 0 a 7.
O Multiscent-20 é um dispositivo digital que apresenta 20 odores, onde o paciente escolhe entre quatro alternativas, com escore de 0 a 20.
Fluxo de Tratamento para RSCcPN
O tratamento da RSCcPN evoluiu com a introdução de biológicos, que são indicados após falha do tratamento clínico e cirurgia, considerando segurança, eficácia e custo-efetividade.
O novo fluxo de tratamento sugere o uso de biológicos após falha em tratamento clínico e cirurgia adequada.
A elegibilidade para biológicos é baseada em quatro pilares: impacto da doença, extensão da doença, comorbidades tipo 2 e biomarcadores de inflamação.
Um questionário de elegibilidade com 11 variáveis é utilizado, com escore final variando de 0 a 25, onde escores <14 indicam não recomendação e ≥14 indicam indicação de uso.
Monitoramento da Resposta ao Tratamento
A resposta ao tratamento com biológicos deve ser monitorada a cada seis meses, utilizando critérios específicos para avaliar a eficácia do tratamento.
A avaliação inclui critérios como melhora na qualidade de vida (SNOT-22), uso de corticoides orais, olfatometria e redução de pólipos nasais.
Respostas são classificadas em boa (4-5 critérios), moderada (1-3 critérios) e não respondedor (nenhum critério atingido).
A troca do biológico ou nova cirurgia é considerada se o paciente não responder ao tratamento.
Definição de Remissão em RSCcPN
A remissão em RSCcPN é definida como controle completo dos sintomas e sinais, com a normalização de marcadores objetivos.
A remissão clínica envolve a normalização de sintomas e sinais, como SNOT-22 e olfato, além de endoscopia nasal mostrando mucosa normal.
A definição de remissão em RSCcPN ainda está em desenvolvimento, necessitando de mais pesquisas sobre biomarcadores.
Importância da Decisão Compartilhada
A medicina de precisão e a decisão compartilhada são fundamentais no tratamento de RSCcPN, permitindo que os pacientes participem ativamente do seu tratamento.
O médico deve traduzir riscos e benefícios das opções terapêuticas de forma clara para os pacientes.
O uso de biológicos deve ser considerado após cirurgia adequada e não como primeira opção, exceto em casos de contraindicação cirúrgica.
A educação do paciente sobre sua participação é crucial para o sucesso do tratamento e para a escolha de opções terapêuticas adequadas.
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Diretriz completa disponível em: /https://aborlccf.org.br/wp-content/uploads/2024/03/Consenso-Imunobiologicos-2024.pdf
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